Uma posta de Carnaval para o
Gonçalo:
"Se se quer construir um espaço aberto, então esse espaço tem de ser muito radical na sua estruturação, porque senão nem sequer será uma base de estímulo para a intervenção seja de quem for."
Ávaro Siza, Arquitectura Portuguesa, 5ª Série, N.º 11, 1987
Vou lendo por aí, que "não é possível" a crítica (de arquitectura), já não apenas nos blogues, mas onde quer que seja, que o meio (arquitectónico) é "escorregadio"... Apetece-me citar, e escrever como o outro, "não é possível adiar a crítica para outro século"!
Na última posta do Gonçalo, abordam-se, a propósito das relações entre os arquitectos e "outros" artistas, tantos "temas" que (me) é difícil saber o que dizer, embora tenha a certeza de que o quero dizer.
Não sabia que as residências "azuis" eram "suas". Reparei nelas (ficam à beira da estrada) numas das últimas visitas ou passagens por Coimbra, já nem sei a que despropósito. (Ah!, já sei, motivos particulares). Não gostei nada. Pensei: mas que raio...! que desagradável que deve de ser estar para ali em cima pendurado naqueles brutalistas paralelepípedos azuis tão violentos para uma paisagem (ainda) semi-rural. E tenho ideia (embora não "ateime") que também vi, e com desconforto senti, a proximidade do cemitério.
Pelas fotos mantenho a mesma ideia, embora vá enriquecendo a leitura que faço do(s) edifício(s)com as memórias da "La Tourette" do Corbu e da "Gallaratese" do Rossi, para as quais creio que remete.
De qualquer modo o "ponto" da posta é outro. Sobre as relações de que já falei, entre "os" artistas. A "intervenção plástica" POP, nas residências Azuis parece-me (provocadoramente) muito bem conseguida, mas o mesmo não penso dos "grafitis" nas residências Laranjas, que já conhecia das fotografias do "
últimas reportagens", também publicadas pela "Anuário # 08".
O novo "grafiti" anónimo, embora um pouco demente (seria curioso saber o que têm de "ingénuo" ou de "engenho"...) perturba e... agrada. Mas não sei até que ponto deverá (o pai da criança) envolver-se na sua "preservação", (adopção?). O seu valor, se lhe atribuímos algum, não será em primeiro lugar, a própria acção do acto subversivo de... vandalismo!
(Nunca cheguei a perceber completamente a história do Bonjour Tristesse, no edifício do Siza em Berlim, mas aquilo têm que ter mãozinha... Na civilizada Alemanha, por certo que o edifício já foi pintado, mais do que uma vez...)
Se alguém lá quiser enviar uma "brigada" anti-grafiti, ou uns pintores "armados" com rolos do AKI, paciência, pode ser que o venha a seguir seja ainda melhor.
Eu que não sou "arquitecto- pai-galinha" aprendi, a manter uma "certa" e digamos - "generosa" - distância às obras.
Manter o "domínio" (a propriedade?), sobre as mesmas, para além do que saudavelmente diz respeito à defesa do que foi projectado e construído, poderá, precisamente nas obras que reclamam essa "abertura" (de que Siza fala na epígrafe), alimentar alguns equívocos sobre o "estímulo para a intervenção" (que é também estímulo à participação dos cidadãos em "projectos democráticos").
Sobre a Centraal Beheer, do Herman Hertzberger, escreveu (em "Essays in Architectural Criticism, Modern Architecture and Historical Changes") Alan Colquhoun: "The gray and large-pored surfaces of the building demand, and get, a good deal of large, and brightly colored bric-a-brac and indoor plants - although the extent to which these are the spontaneous acts of the employees or gifts from a sensitive and tasteful management is not altogether clear".
A questão é: será que queremos transformar "
actos espontâneos" em "
oferendas de uma administração sensível e com bom gosto", mesmo quando esse "bom gosto" da "aposição" seja "consagrado" pelo arquitecto?